Navio Capitânia da Esquadra Brasileira
22:02
Coronel de Artilharia Rfm.
Aportou em Santos, no início da tarde do dia 18/11/2011, o navio aeródromo São Paulo, em sua primeira “manobra naval” após longo período de repotencialização. O NAe São Paulo foi saudado pela Fortaleza de Santo Amaro com uma salva (simulada) de 17 tiros de Artilharia. Este tipo de saudação militar, de origem medieval, ocorria praticamente em todos os portos do mundo quando um navio de guerra ou uma esquadra “desfilava” diante do principal reduto de defesa situado em terra firme: uma demonstração de amizade e de respeito mútuo. Esta secular tradição hoje ocorre apenas em eventos de grande vulto, como, por exemplo, a salva de 21 tiros na cerimônia de transmissão do cargo de Presidente da República.
No período colonial havia também tiros de salva no sentido de alertar sobre a aproximação de “navios de suspeita”, descrito no Plano de Defesa do Porto de Santos de 1800 e assim resumido: o Forte Augusto (hoje Museu de Pesca) dava um tiro de salva; a Fortaleza de Santo Amaro repicava com dois tiros de maior potência e o sinal de alerta era repassado pelo troar dos canhões das demais fortificações de defesa do então incipiente Porto de Santos. A notícia era levada a cavalo até São Paulo para alertar toda a Capitania sobre o perigo eminente.
Descreve ainda o referido Plano de Defesa, de dezembro de 1800:
“Toda a gente da Villa [de Santos] capaz de pegar em Armas / excetuados os que devem laborar com a Artilharia do Forte [Santo Amaro], ou que são destacados para outra parte /
marcharão ao ponto que lhe for ordenado pelo commandante da mesma
marcharão ao ponto que lhe for ordenado pelo commandante da mesma
Villa, levando todasas suas armas (...).”
Era o povo defendendo sua ‘villa”. Hoje, felizmente, não temos piratas nem corsários e o troar dos canhões foi substituído por sinais de satélites e radares de longo alcance. Também não se espera a presença de “navios de suspeita”.
Na aproximação do NAe São Paulo, além da salva (simulada) de tiros de Artilharia a Capitania dos Portos exibiu mensagem de boas-vindas fixada nas rústicas e espessas muralhas do mais expressivo conjunto arquitetônico-militar do Estado de São Paulo,
que ali está desde 1584 "vigiando" o canal de acesso ao Porto e, literalmente, todas as praias da baía de Santos. A saudação constou ainda de uma formidável queima de fogos.
Um visual deslumbrante! Uma oportunidade ímpar para se registrar esta imagem a partir das muretas da Ponta da Praia ou no Deck do Pescador. Para a Imprensa e os convidados da Capitania dos Portos foi aberta a possibilidade de ocuparem as plataformas de tiro da Fortaleza de Santo Amaro em posição que fica a uma
altura referencial ao tombadilho do NAe São Paulo, em distância
aproximada de 100m, pois o canal de navegação muito se aproxima daquela monumento histórico-militar.
A divulgação de uma imagem do Navio Capitânia “desfilando” diante do único exemplar de uma arquitetura militar com muralhas que se alongam em “cortadura” para proteger todo o esporão rochoso que avança mar adentro se apresenta, assim, como um “chamamento” para que a sociedade santista venha a dar atenção maior àquele patrimônio histórico nacional –
patrimônio de todos nós – o qual se apresenta tão claramente diante dos nossos olhos, por mais de quatro séculos, expondo sua rasante estrutura de pedras pintadas de branco e expostas ao sol do entardecer.
Na defesa do pré-sal – um dos motivos da “ação de presença” do NAe São Paulo, suponho – há que se considerar os motivos que levaram os portugueses a construir um sofisticado sistema defensivo para o incipiente Porto de Santos entre 1551 e 1734.
Ao todo seis fortes, um fortim e uma Casa do Trem Bélico
(para prover o apoio logístico).
A História, sem dúvida, mantém em seus “arquivos” inúmeras fontes de sabedoria que, vez por outra, devem ser consultadas. E a História prossegue... não mais com sucessivas “cortinas defensivas” fixas para abrigar a extinta Artilharia de Costa, mas sim com naves e aeronaves com nova arquitetura militar apta a lançar vetores balísticos de posições fugazes (cortinas virtuais). A Estratégia de Defesa foi e ainda é de dissuasão visando dirimir vontades antagônicas apenas pela “ação de presença”.
Os fortins, fortes, fortalezas que sobrevivem e pontilham a fronteira terrestre e o litoral do Brasil precisam ser preservados. Este fantástico acervo histórico-cultural está inserido no “DNA” da nossa Nação e bem representa o viés militar das bandeiras criadas por D. Sebastião em 1570, na antiga sede da Capitania de São Vicente. Já não se ouve o troar dos seus canhões, felizmente, mas é preciso saber aproveitar o antigo sistema defensivo do Porto de Santos como equipamento para o turismo histórico-cultural a fim de evitar que se perca na poeira do tempo.
Este oportunidade de rever o passado e projetar o futuro nos está sendo oferecida pelo Capitão dos Portos de São Paulo, honrando a Fortaleza de Santo Amaro com uma mensagem de boas-vindas ao Brasil do futuro, por meio do Navio Capitânia da Esquadra Brasileira, que retorna, após longa data ao Porto de Santos
Elcio Rogerio Secomandi
Coronel de Artilharia Rfm.
Professor Emérito da Universidade Católica de Santos
Projeto de Defesa
do Porto de Santos, Erico A. Oliveira, c. 1897.
Arquivo Histórico do Exército.
Copia e foto autorizados para divulgação
AHEx – Perquisa nº 069/2003
Fonte de consulta:
PARA A HISTÓRIA DE SÃO PAULO”.
Plano de Defesa da Capitania de São Paulo, dez 1800
. Archivo do
Estado de São Paulo. VLII.
MADRE DE DEUS, Frei
Gaspar.
Memórias para a História da
Capitania de São Vicente.
São Paulo: Martins, 1953.
MORI, Victor Hugo. Arquitetura Militar:
Um Panorama Histórico a
Partir do Porto de Santos.
S. Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo/
Fundação Cultural Exército Brasileiro, 2003.
1 comentários
Ótima matéria.....nossa história é muito rica....Parabéns.....
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