Mudanças climáticas aumentam o risco de surtos de doenças transmitidas por mosquitos
14:26
O aumento da
temperatura média do planeta, induzido principalmente pela emissão de gases de
efeito estufa, deve contribuir para ampliar, no Brasil, a área de distribuição
de quatro vírus transmitidos por mosquitos: o Oropouche (OROV), o Mayaro
(MAYV), o Rocio (ROCV) e o vírus da encefalite de Saint Louis (SLEV).
A conclusão é de um estudo publicado na revista PLoS Neglected Tropical Diseases. O
trabalho foi realizado no Instituto Butantan durante o doutorado de Camila
Lorenz, com apoio da
FAPESP e orientação de Lincoln
Suesdek, do Departamento de Parasitologia. Também
participaram os pesquisadores Flávia Virginio, Thiago Salomão, Breno Aguiar e
Francisco Chiaravalloti-Neto, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de
São Paulo (FSP-USP).
“Levantamos todos os surtos dessas arboviroses ocorridos no país desde a
década de 1960 e avaliamos como eles se relacionavam com diferentes fatores
ambientais. Com base nos resultados, modelamos a distribuição das doenças até
2100. Os dados mostram que a área de distribuição dos quatro arbovírus deve
aumentar nos próximos anos em função, principalmente, da temperatura”, disse
Lorenz à Agência FAPESP.
Ao todo, sete
fatores ambientais foram considerados na análise multivariada: precipitação
anual (o quanto chove ao longo do ano na região em que ocorreu o surto), média
de temperatura anual, elevação (altitude), sazonalidade da temperatura
(variação entre os meses mais quentes e mais frios do ano), sazonalidade da
precipitação (variação entre os meses mais chuvosos e os mais secos), amplitude
térmica (variação da temperatura ao longo do mês) e variação diária da
temperatura.
De acordo com
Lorenz, os resultados sugerem que cada vírus é afetado de forma diferente pelas
variáveis ambientais. No caso do Oropouche e do Mayaro, por exemplo, os fatores
que se mostraram mais associados à ocorrência de surtos foram a média anual da
temperatura e a amplitude térmica. Ambos os vírus mostraram características
semelhantes e se distribuem principalmente na região Norte do país. Já para
Saint Louis e Rocio a precipitação anual teve mais peso – quanto mais alta a
média anual de chuva, maior o número de surtos.
“Embora fracionada
em diferentes variáveis, a temperatura esteve de algum modo presente em todos
os casos. A precipitação também apresentou alguma contribuição para a
ocorrência dos surtos, já que a presença de água é necessária para a reprodução
dos mosquitos”, disse a pesquisadora.
A variável
altitude, segundo Lorenz, teve mais influência apenas sobre a distribuição do
vírus Rocio. Um grande surto causado pelo patógeno foi registrado no Vale do
Ribeira, região de baixa altitude no sul do Estado de São Paulo, por volta de
1975.
“Já existe a noção
de que a temperatura é um fator importante para as doenças tropicais, mas, por
mais que o senso comum aponte para uma direção, só temos segurança científica
por meio de experimentos ou validação estatística. E observamos que, como os
vírus têm características diferentes, ciclos de vida diferentes dentro e fora
do hospedeiro, não são influenciados da mesma maneira pelos fatores ambientais.
Este estudo dá diretrizes para o refinamento das estratégias de detecção e de
controle dessas doenças”, disse Suesdek.
“No caso
do Mayaro e do Oropouche, vemos dois cenários futuros bem diferentes do atual –
seja com baixa ou com alta emissão de gases. Já para Saint Louis e Rocio a
diferença não é tão gritante. Mas mesmo um aumento pequeno é importante, pois
são doenças pouco conhecidas e contra as quais não temos vacinas”, avaliou
Suesdek.
Para o pesquisador, as quatro
doenças estudadas apresentam significativo potencial de causar danos à saúde
pública e podem ser consideradas negligenciadas. Todas têm como principal
sintoma febre aguda e intensa. Por serem facilmente confundidas com dengue ou
malária, especialistas acreditam que a subnotificação seja grande. Não existem
testes sorológicos para diagnóstico (aqueles que detectam os anticorpos contra
o vírus no sangue de pacientes) e os exames moleculares são caros e pouco
acessíveis.
O artigo Impact of environmental factors on neglected emerging arboviral
diseases (doi: https://doi.org/10.1371/journal.pntd.0005959),
de Camila Lorenz , Thiago S. Azevedo, Flávia Virginio, Breno S. Aguiar,
Francisco Chiaravalloti-Neto e Lincoln Suesdek, está publicado em http://journals.plos.org/plosntds/article?id=10.1371/journal.pntd.0005959.
Fonte: Fapesp
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